Manifesto para a recuperação do crescimento e estabilização económica pós-Covid19
A Urgência de uma Nova Estratégia de Crescimento
Portugal está a passar pela maior recessão de que há memória, que requer políticas vigorosas e apropriadas para recuperar a economia e relançar o crescimento. Não há margem para erros que poderão custar caro a esta e às gerações seguintes. A principal causa da nossa quase estagnação nas duas décadas anteriores foi a má aplicação dos recursos, resultantes de políticas económicas e decisões empresariais erradas, de que a crise económica e bancária é a evidência mais forte das suas pesadas consequências.
O país não pode mais uma vez embarcar numa aventura como a Estratégia do Hidrogénio, que absorverá uma parte significativa dos recursos, financiando projectos sem rentabilidade, usando tecnologias que, por não estarem ainda dominadas, só vão fazer subir custos de produção e preços no consumidor, ou onerar o contribuinte, via subsídios do Estado, e assim reduzir o crescimento.
O que o País necessita é de investimentos produtivos, virados para as exportações, que promovam a modernização e dinamização da estrutura produtiva ou infraestruturas estratégicas, que possam aumentar a produtividade e, assim, reduzir a pobreza e evitar que continuemos a caminhar para a cauda da União Europeia.
Não se compreende mas políticas económicas, energética e a estratégia do hidrogénio propostas pelo Governo num país com cerca de 20% de pobreza, e a necessitar de um forte investimento produtivo para poder aumentar o seu rendimento per capita. Só com projectos viáveis, competitivos, com uma adequado equilíbrio no financiamento e na partilha de riscos entre os fundos públicos afectos ao projecto e o investimento privado, que aumentem a competitividade no sector dos bens transaccionáveis se poderá aumentar a nossa taxa de crescimento potencial, garantir empregos bem remunerados e fomentar a coesão económica e social.
A urgência de uma nova Estratégia de Crescimento
1. Depois da quase estagnação do rendimento per capita dos portugueses nas últimas duas décadas, Portugal está a sofrer a maior queda do PIB de que há memória, pelos efeitos da política de lockdown adotada pelo Governo, para evitar os contágios do vírus.
As últimas estimativas do Banco de Portugal e da Comissão Europeia apontam para uma queda do Produto Interno Bruto (PIB)em 2020 próxima dos 10% – uma perda de 20 mil milhões de Euros. Esta evolução deve-se à impreparação do governo, à semelhança dos países europeus, para combater a epidemia, quando comparado com as políticas mais eficazes dos países asiáticos, com muito menores custos económicos.
2. A recuperação será lenta, prevendo-se um crescimento de 5,2% para 2021 e 3,8% em 2022, pelo que só em 2023 se poderá recuperar os níveis da pré-crise. Mas isto depende das políticas que o governo adotar. E devemos alertar que a uma crise económica tão profunda, em que se pediu uma forte contribuição dos bancos, se perspetiva uma nova crise bancária, que levará à necessidade de novas capitalizações das instituições bancárias.
3. A esta ameaça junta-se outra que é a de uma crise financeira. Para reduzir a dívida, que deverá atingir o valor record de 134% do PIB, será essencial voltar a entrar numa trajectória descendente da dívida pública, o que implica regressar a um excedente estrutural primário de 3% do PIB. Ora como já nos encontramos com um record na pressão fiscal, e o seu aumento só levaria a uma redução do crescimento económico, a única opção é cortar na despesa corrente do Estado e aumentar a eficiência das políticas públicas e administração. Estará o governo consciente desta necessidade? A intervenção do Banco Central Europeu (BCE) através da compra maciça de obrigações poderá mitigar o problema, mas esta não se vai prolongar eternamente, e não substitui o cumprimento das regras do Pacto Orçamental do Euro.
4. O problema de base, que se põe com mais acuidade depois desta crise colossal, é do desafio do baixo crescimento da economia portuguesa, que tem mantido uma trajectória do PIB potencial de uma taxa de crescimento anual de 1,5%. Se não invertermos esta trajectória, estamos a caminho da cauda da União Europeia (EU), e agora com maior probabilidade, devido às marcas profundas que a epidemia causou.
5. A UE tem disponibilizado um conjunto de ajudas aos Estados Membros que são uma oportunidade única para recuperar a economia. Só o programa de “NextGeneration EU” deverá proporcionar 26.1 mil milhões de Euros, em transferências e empréstimos, adicionais aos fundos estruturais do Quadro Financeiro Multianual de 2021-2027, de 29,8 mil milhões de Euros. Irá este dinheiro ser canalizado para o reforço da capacidade produtiva das empresas ou infraestruturas estratégicas?
6. A principal causa da falta de convergência para a UE tem sido o desbaratar dos recursos do país em projetos sem rentabilidade resultantes da má gestão pública e empresarial. A crise bancária, que já custou mais de 40 mil milhões de Euros aos contribuintes, acionistas e clientes, é a manifestação mais visível destes erros. Teremos aprendido com os nossos erros?
7. Como acelerar o crescimento? É essencial uma nova política económica consubstanciada numa Nova Estratégia para o Crescimento, incorporando políticas económicas focadas na melhoria da competitividade das empresas e reforço das exportações, coadjuvada por um conjunto de reformas políticas para reforçar as instituições e revigorar a democracia
8. As novas políticas económicas devem abranger, entre outras, (i) desenvolvimento do setor de cuidados de saúde,articulando unidades públicas,privadas e do sector social, protegendo as populações da recorrência da pandemia e melhorando a equidade no acesso; (ii) aperfeiçoamento do sistema de investigação e inovação empresarial, com o reforço quer das ligações universidade-empresa quer das competências das instituições de interface, designadamente dos centros tecnológicos e institutos de novas tecnologias,lançados no Programa Específico de Desenvolvimento da Indústria Portuguesa (PEDIP), estímulo à investigação tecnológica virada para as empresas e à inovação empresarial, assim como a inserção de doutorados nas empresas; (iii) investimento nas infraestruturas de integração com a Europa, nomeadamente nas ligações ferroviárias de bitola europeia do corredor atlântico; (iv) re-industrialização baseada na economia do conhecimento,na maior integração da robótica, inteligência artificial e impressão 3D, nas transições digital e ambiental, no aumento da produtividade e da dimensão empresarial e no reforço da clusterização de base tecnológica (um novo Projeto Porter), robustecendo os novos clusters tecnológicos em que o país já tem uma base razoável – materiais, biotecnologia, tecnologias de informação e comunicação, ciências da saúde, aeronáutica, mobilidade-e apoiando o upgrade tecnológico dos clusters ligados aos setores tradicionais; (v) captação de Investimento Directo Estrangeiro (IDE) tirando vantagem do processo de re-shoring e near-shoring que a crise global irá acelerar. Neste contexto é extremamente importante termos o objectivo de atrair três ou quatro grandes projectos de empresas integradoras, tipo Autoeuropa, que aumentem as exportações e contribuam para o desenvolvimento de novas empresas suas fornecedoras que depois também se tornem exportadoras; (vi) estímulos à aceleração da qualidade do capital humano através da melhoria da qualidade da educação a todos os níveis, designadamente ao nível dos programas escolares e da maior exigência aos professores e alunos, e do reforço do ensino de cariz profissionalizante, dada a falta dramática de quadros intermédios especializados; (vii) criação e instituição da capacidade de planeamento estratégico do país; (viii) reforma fiscal amigável do crescimento; e (ix) reforma do sistema de justiça no sentido de permitir a resolução dos litígios num prazo razoável e mediante um processo equitativo, com especial ênfase no processo tributário e na adjudicação de direitos e obrigações entre investidores e o Estado.
9. Os 45 mil milhões de Euros que Portugal irá receber de transferências da UE até 2027 devem ser maioritariamente canalizados para o sector privado, e com especial preferência para a dinamização das exportações. Neste contexto, importa dar ênfase a uma politica industrial que permita o lançamento dum novo PEDIP 5.0 como apresentado já em boa hora pela AEP-Associação Empresarial de Portugal, que possibilite o reforço da inovação empresarial e a aposta nas cadeias de valor e na clusterização referida, com IDE e parcerias internacionais com players de referência nos vários sectores, contendo também uma linha de reforço dos capitais próprios e do crescimento em dimensão das empresas portuguesas.
As limitações da Política Energética até 2030
10. A política energética,que tem sido apenas um subproduto das políticas ambientais e climáticas, merece-nos uma preocupação especial, perante as propostas do governo e, em especial, a Estratégia do Hidrogénio.
Consubstanciada num projecto que pretende ser o maior jamais lançado em Portugal, cuja mais valia intrínseca não é justificada,aparece como meramente instrumental dos objectivos da descarbonização e da transição energética e que poderá consumir substanciais fundos europeus,o que não é compatível com a utilização desses fundos para apoiarem projectos que promovam a dinamização e modernização da estrutura produtiva,com uma equilibrada partilha de riscos entre o sector privado e o sector publico.
A eficiência energética da cascata do hidrogénio é muito baixa, o seu manuseamento reveste-se de alta perigosidade, e a dependência destas tecnologias de metais preciosos (platina), torna problemática a sua massificação.
11. A política energética tem sido um dos outros factores de bloqueio do crescimento. Os consumidores portugueses já pagaram cerca de 22 mil milhões de Euros em subsídios à produção, subsídios esses que não contribuíram para o crescimento, e têm sido um desperdício de recursos, alimentando lóbis poderosos, em detrimento da competitividade e onerando até as classes mais desfavorecidas. E os consumidores são além disso responsáveis pela Dívida Tarifária do Setor Elétrico que ascende a 3.000 mil milhões de Euros.
O maior erro foi a introdução de tecnologias ainda imaturas, como as eólicas em grande escala e a solar em menor escala, de forma maciça, sem criação de valor acrescentado nacional e emprego. Entretanto,o preço médio de fornecimento dessas energias renováveis caiu significativamente com a evolução tecnológica ocorrida. Se fosse hoje instalada, o custo seria entre40e 60% inferior ao que ainda estamos a pagar pelos 7 000 MW da potência intermitente instalada. O novo Plano Energético proposto pelo governo prevê a adição de mais 11 GW até 2030 de eólicas e solar;Isto vai onerar seriamente a capacidade de geração, devido à sua intermitência e falta de adequação aos períodos de maior procura, implica a necessidade de centrais redundantes para ocorrer a estas falhas, aumentando a quantidade de electricidade que já hoje é vendida a preço zero no mercado grossista.
12. Um factor que continua a agravar as consequências negativas do predomínio dessa base de tecnologias eléctricas intermitentes(eólica e solar) em Portugal é a reduzida capacidade das interligações entre Espanha e França, fazendo com que a Ibéria seja quase como uma ilha eléctrica em relação ao continente europeu. Este alargamento do mercado torná-lo-ia mais competitivo, mas não deve ser utilizada para uma expansão das nossas energias intermitentes, uma vez que pagando os consumidores portugueses as tarifas a preços politicamente (feed-in) elevados, levaria a que passássemos a subsidiar os clientes europeus.
13. Há um princípio simples, que os nossos dirigentes ainda não perceberam: a política energética só contribui para o crescimento se houver uma redução dos custos de produção, como é o caso da melhoria da eficiência energética, ou se estivéssemos a substituir uma fonte de energia mais cara por outra mais barata.
A introdução de fontes de energia mais caras, que venham a substituir as mais baratas, poderá reduzir as emissões de carbono, mas representa um sacrifício para o nosso rendimento e para a nossa competitividade, afectando as exportações e o emprego. Na prática, trata-se dum subsídio nosso aos países mais poluidores. Ninguém explicou isto aos cidadãos!
14. As alterações climáticas representam um grande desafio para a humanidade, mas é essencial ter o sentido das proporções. O país com maior participação nas emissões de CO2 em 2017 (Dados da Comissão Europeia, Edgar) foi a China contribuindo com 29,3% do total global, seguindo-se os EUA com 13,8%. A Alemanha contribuía com 2,15%, e Portugal com uns meros 0,15%. Se dividirmos a proporção da emissão pela proporção da população mundial, verificamos que este rácio é de 3,2 para os EUA, 1,97 para a Alemanha e apenas de 1,13 para Portugal. Portanto, não só temos uma proporção muito reduzida na sua contribuição para as emissões globais, como a nossa taxa já é muito inferior ao destes grandes países.
Não tem, pois, fundamento colocar no topo da agenda para o nosso bem-estar, ou para “salvar o clima do planeta”, o objetivo de redução drástica do carbono: uma redução em 50% das nossas emissões apenas reduz as emissões globais em 0,075%, com um elevado custo para o país, seguindo as políticas climático-ambientais propostas. Consequentemente, a nossa contribuição para as emissões globais deve ser negociada com a Comissão Europeia de forma equitativa.
Os erros da Estratégia Nacional para o Hidrogénio (EN-H2)
15. Não existe até hoje nenhum país que tenha adotado um plano energético em que o hidrogénio ocupe um papel relevante, apesar das propostas de alguns grupos de interesse tecnológico. Relatórios de entidades credíveis como a Agência Internacional da Energia (AIE), e Universidade de Oxford/Imperial College, consideram que existem ainda muitas incertezas do ponto de vista tecnológico, e que as alternativas do seu uso não só são as mais caras na atualidade, como ainda continuarão a ser nos próximos vinte anos.
16. Infelizmente, a Estratégia Nacional para o Hidrogénio (EN-H2) mantém as graves consequências do regime da Produção em Regime Especial que apoiou precocemente tecnologias renováveis intermitentes e imaturas,continuando a apostar em tecnologias emergentes e muito arriscadas para armazenar eletricidade à custa dos consumidores.
Na produção de hidrogénio que é proposta, que é uma tentativa de armazenagem indirecta de electricidade, devem ser os respetivos promotores a suportar os inerentes custos de desenvolvimento, com comparticipação limitada aos Fundos Europeus destinados à Ciência e Tecnologia, pois estes sabem melhor avaliar os riscos do que os funcionários públicos.
17. Com efeito, em termos de eletrolisadores propostos,com tecnologias capazes de produzirem hidrogénio com pureza suficiente para poder abastecer células de combustíveis só existem protótipos de 5 Megawatts (MW). E fala-se agora dum novo projeto no porto de Ostende na Bélgica, para arrancar em 2025 com uma dimensão de 300MW. Tudo isto muito abaixo da dimensão prevista na EN-H2 superior a 1000 MW.
18. A Comissão Europeia propôs um vasto programa de investigação e desenvolvimento (I&D) para a produção de hidrogénio, com vista a descarbonizar a geração de eletricidade a partir das fontes fósseis e o transporte pesado, sem contabilizar os custos para famílias e empresas. Portugal assume-se como campeão mundial deste projeto, ao propor na EN-H2 um envelope financeiro que é cerca de 10 a 20% do total projetado pela Comissão Europeia, um país que representa 1,6% do PIB da União. Este esforço de I&D deveria ser sobretudo empreendido pelas grandes economias como os EUA, Japão e Alemanha. Ora, segundo a Agência Internacional da Energia, a Alemanha, país com uma economia 16 vezes superior à nossa, projeta investir 9 mil milhões de Euros até 2030, quase o mesmo montante que Portugal!
19.A EN-H2 aprovada pelo Governo e em discussão pública, pretende instalar até 2030,2 GW em eletrolisadores para produzir hidrogénio, com um custo de 7 mil milhões de Euros, destinados apenas ao consumo interno. O principal uso seria a substituição de 15% de gás natural através de injecção nas redes, e 5% no transporte rodoviário para o qual se pretende construir entre 50 a 100 estações para automóveis até 2030, que se expandiria até 1 500 estações até2040.
20. A única justificação económica apontada é a substituição de importações de gás natural. Ora, para um pequeno país de economia aberta não faz qualquer sentido uma estratégia de substituição de importações, e mesmo assim só teria mérito se reduzisse o custo para o utilizador final. Mas não é isso que acontecerá; o custo do hidrogénio injetado, apesar de utilizar a energia solar, custará entre o dobro ou o triplo do gás, pelo que o consumidor final verá a sua facturado gás subir entre 15 e 30%.
21. Note-se ainda que, mesmo a introdução de hidrogénio misturado com metano na rede de gás natural até uma percentagem da ordem dos 20% apontada na EN-H2, carece da autorização de Espanha, porque a composição do gás actualmente aceite na rede do Mercado Ibérico do Gás, instalada nos dois países, não o permite. E a Espanha não participa na EN-H2, nem se refere no respetivo texto qualquer participação espanhola na mesma.
22. A utilização para abastecimento de automóveis movidos a hidrogénio apontada a EN-H2não tem base tecnológica. O grau de imaturidade tecnológica revelado é bem evidente na confusão entre a utilização do hidrogénio misturado com metano na rede de gás natural, e a utilização do hidrogénio em células de combustíveis de veículos rodoviários.
De facto, o hidrogénio misturado com metano não pode ser utilizado em células de combustível, pelo que a rede de gás natural misturado com hidrogénio só poderá ser utilizada para aquecimento. Por causa deste problema, os cenários dos relatórios acima indicados apenas consideram viável nos próximos vinte anos a utilização em veículos pesados com baixas emissões.
23. Sublinhe-se também por outro lado que o hidrogénio é um gás muito leve e que por isso a armazenagem de hidrogénio de elevado grau de pureza, exige condições de muito altas pressões e muito baixas temperaturas que implicam custos e riscos de segurança muitíssimo elevados, e tendo de ser completamente separada das instalações de armazenagem de misturas de metano e hidrogénio.
Qualquer veleidade duma rede de distribuição, ou exportação, de hidrogénio a fim de ser utilizado em células de combustível (tecnologia incipiente e com durabilidade curta),para permitir o abastecimento da frota automóvel a pilhas de combustível exigiria uma nova rede de distribuição e armazenagem específica, completamente autónoma da actual rede de gás natural com custos mais elevados e incomportáveis para a economia.
Mesmo os poucos automóveis de passageiros existentes no mercado são entre 3 a 4 vezes mais caros que ostradicionais, e só a generalização de redes de abastecimento nos países mais desenvolvidos – o que nenhum governo ainda anunciou – poderá fazer baixar o preço.
24. Segundo a Comissão Europeia, o hidrogénio cinzento produzido a partir do gás natural, e que a Galp já faz, custa 1,5 Euros por kg. Se a este custo adicionarmos o custo de sequestração do carbono emitido, teremos um total de 2,5 Euros por kg, na produção do chamado hidrogénio azul. O chamado hidrogénio verde obtido por eletrólise, a partir de fontes renováveis, custaria no mínimo, com a tecnologia existentes, 5 Euros por kg, podendo, segundo outras fontes, atingir um custo de produção três vezes superior ao do hidrogénio azul. Por isso, a Comissão admite avanços, na próxima década, para o hidrogénio azul.
25. Até 2040 a EN-H2 prevê instalar 3 Gigawatts (GW) em eletrolisadores que se destinam sobretudo a substituir 50% do consumo em fuel e gás natural das centrais termoeléctricas, que se expandiria a 5 GW até 2050. Este projecto, de transformação da electricidade em gás para depois voltar a produzir eletricidade é uma das formas de armazenar a energia produzida por fontes intermitentes, e que em Portugal já são largamente excedentárias em períodos de baixo consumo horário. É um custo faraónico, de cerca de 20 mil milhões de Euros, para apenas substituir 10% do consumo final de energia.
26. Não tem racionalidade económica investir na produção de hidrogénio a partir das intermitentes, pelo menos nos próximos 10 a 15 anos. Hoje tem um custo muito mais elevado que o hidrogénio obtido através do gás natural, e a Indústria do setor espera uma redução de cerca de 60% deste custo. Vale a pena esperar.
Mas a geração de eletricidade a partir desse hidrogénio terá ainda custos elevados. De facto, existe aqui uma dupla produção, comum custo elevado: primeiro utiliza-se a energia solar para produzir hidrogénio e depois volta a utilizar-se o hidrogénio para produzir eletricidade. Tomemos um custo da energia renovável de 25 Euros por Megawatt-hora (MWh), como a EN-H2 refere. Num cenário futuro otimista, já depois de forte abaixamento de custos, suponhamos que comum factor de capacidade de 50% se consegue produzir hidrogénio, por eletrólise, a 1,70 Euros por kg (com a tecnologia atual é pelo menos 2 a 3 vezes superior). Armazenando este hidrogénio em cavernas no subsolo custa,pelo menos, mais 0,30 Euros. Se este hidrogénio for agora utilizado para produzir eletricidade custa entre 100 e 200 Euros por MWh, o que é muito superior ao custo médio dos 40 a 50 Euros por MWhdas fontes alternativas mais eficientes a operar atualmente em Portugal.
27. A localização da fábrica de hidrogénio em Sines também levanta dois problemas importantes, que não foram devidamente equacionados. O processo de eletrólise para fabricar hidrogénio, exige grandes quantidades de água pura, que não estão disponíveis na região. Para a produzir seria necessário instalar uma fábrica de dessalinização da água do mar, a um custo adicional de cerca de 20 Euros por MWh, que acresceria ao preço final acima referido. A EN-H2 refere a utilização de águas residuais, que não só também não existem na região, como a sua destilação exigiria acrescidos custos.
Há ainda outro problema que é o do transporte e armazenamento, pois as cavernas disponíveis para o fazer seriam as do Carriço/Pombal, que distam cerca de 300 km, onerando ainda mais o custo de produção.
28. Só a partir da década de 2030 se prevê a exportação de hidrogénio, mas nem a AEI considera a viabilidade de transporte e comércio internacional no horizonte pretendido, pois o custo de transporte a média-longa distância é muito elevado.Além disso, actualmente o hidrogénio produzido por eletrólise é cerca de 3 a 5 vezes mais caro do que o hidrogénio produzido através de gás natural,como é produzido em Portugal nas refinarias da Galp, pelo que só uma forte redução dos custos o tornaria competitivo a nível internacional.
29. A EN-H2 prevê investir 20 mil milhões de Euros, com a atribuição de subsídios directos de fundos europeus ou de garantias do Estado a empréstimos, devido às incertezas existentes para os empresários, numa lógica de mercado. Trata-se não só de um montante extraordinário para um país muito endividado, como vai competir com necessidades urgentes de investimento que terão de ser adiadas ou abandonadas. E não se deve cair no erro e pensar que ao obter subsídios da União Europeia se melhora a sua viabilidade, pois esses fundos poderiam sempre ser utilizados para aplicações alternativas mais rentáveis, mesmo na área da energia. Foi esse o erro muitas vezes repetido nos grandes projectos dos anos 2000.
30. O EN-H2 não gera crescimento económico, pois aumenta os custos de produção para o país. A maioria dos investimentos seriam em equipamentos importados da Alemanha e de outros países, cujos produtores estariam evidentemente muito interessados na sua realização. Além disso, não cria emprego nem valor acrescentado nacional significativos.
31. Não podemos repetir o maior erro na introdução maciça das renováveis na década dos anos 2000 que foi o investimento em tecnologias que ainda estavam imaturas. Entrar na economia do hidrogénio em força como o Governo pretende é repetir, com custos ainda mais elevados, esse erro. Os grandes projetos de investigação e desenvolvimento (I&D) deste tipo são para as grandes economias, com grande capacidade financeira, e com indústria e sistemas de investigação como a Alemanha e os EUA. Até agora a Alemanha apenas planeia investir umas centenas de milhões de Euros em programas experimentais. Utilizando uma analogia, ninguém pensaria que Portugal pudesse entrar agora na corrida espacial para colocar um homem em Marte!
32. Não se compreende uma estratégia deste tipo num país com cerca de 20% de pobreza, e a necessitar de um forte investimento produtivo para poder aumentar o seu rendimento per capita.Não é de mais insistir que só com projetos viáveis,competitivos,com uma adequado equilíbrio no financiamento e na partilha de riscos entre os fundos públicos afetos ao projeto e o investimento privado,que aumentem a competitividade no sector dos bens transacionáveis se poderá aumentar a nossa taxa de crescimento potencial, garantir empregos bem remunerados e fomentar a coesão económica e social.
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