I. A APOSTA NA INDUSTRIA

Portugal perdeu em termos económicos as duas primeiras décadas do século XXI, pois há vinte anos que a economia portuguesa não cresce.

Portugal é um pais em estado intermédio de desenvolvimento, mantendo um modelo económico que infelizmente se aproxima dos países menos desenvolvidos em que o PIB ainda tem dependência significativa dos setores do turismo, comercio e serviços de baixo valor acrescentado.

Importa mudar este modelo através dum processo de industrialização que não pode significar apenas investimento no que temos, mantendo as mesmas tecnologias e processos de fabrico, mas  que comporta uma alteração significativa de processos em toda a cadeia de valor, com grande incorporação de inovação empresarial e de tecnologia, o que pressupõe o acompanhamento pelo nosso pais do processo de industrialização europeia com transformação digital(Industria 4.0) e a transição ambiental(com economia circular)-um novo paradigma de produção industrial  com incorporação de serviços de valor acrescentado, inovação(eco inovação inclusive) e as tecnologias da 4ª Revolução Industrial. Tal tem de ser acompanhado pelo investimento, designadamente IDE, em unidades produtivas de bens transacionáveis, alinhadas com esse novo paradigma.

Reindustrializar não significa voltar a modelos do passado assentes na mão de obra barata, mas sim aderir ao modelo da economia do conhecimento, injetando conhecimento e engenheiros nas empresas em articulação com as Universidades, os Politécnicos e o Sistema da Ciência e Tecnologia. Reindustrialização nos nossos dias não é apenas a manufatura, mas sim a produção de todos os bens e serviços transacionáveis que conseguirmos não só exportar, mas em que também conseguimos reduzir em mercado aberto e concorrencial as importações através da produção nacional

Acontece que já existem em Portugal engenharia e escolas de engenharia com qualidade europeia e o mesmo se poderá dizer das nossas melhores escolas de gestão e da nossa infraestrutura de comunicações, e esperamos que esta infraestrutura continue a mantê-la com o avanço para o 5G.

Com o bom nível das infraestruturas digitais e a qualidade dos nossos engenheiros, podemos também ser uma fábrica para o Mundo na área dos serviços executados por via digital e um gateway (cabos submarinos, data centers, estações de controlo de satélites) para as infraestruturas digitais.

Mas para permitir esta reindustrialização Portugal deve remover os chamados “custos de contexto” que existem no nosso País, e que dependem apenas de decisões políticas internas. Para tornar possível esta reindustrialização, o nosso país deve dispor de fatores competitivos de produção, nomeadamente na rapidez na aprovação de projetos industriais, de impostos que incentivem a produção ou o reinvestimento de resultados, nomeadamente a nível do IRC, de mão de obra técnica qualificada, de uma legislação laboral que permita aumentar ou diminuir o número de colaboradores em função das necessidades do mercado, ou ainda de uma energia barata. Sobre este último aspeto, é importante referir que Portugal tem atualmente uma das mais altas tarifas de eletricidade na União Europeia para as PMEs.

A reindustrialização do nosso país, exigirá um enorme conjunto de recursos — físicos, logísticos, financeiros e de conhecimento. As verbas provenientes da União Europeia, parecem muito elevadas, mas não produzirão qualquer alteração significativa na nossa matriz industrial, se não forem bem aplicadas. Mesmo bem aplicadas podem ser escassas para a profunda alteração que a nossa estrutura industrial necessita!

Só conseguiremos uma alteração razoável, aproximando-nos mais dos restantes países europeus, se construirmos um modelo estruturado e lógico, de atuação dos vários players, no desejado processo de reindustrialização do país, bem percetível pelos destinatários, que serão prioritariamente as empresas.

Este processo estruturado deve iniciar-se pelo estudo detalhado e construção pormenorizada da nossa matriz atual Sectores / Tecnologias, a partir da qual se traçará um programa de robustecimento desta matriz.

II. EXPORTAÇÕES E INTERNACIONALIZAÇÃO

O objetivo da década, que é uma condição para a sobrevivência de uma economia moderna em Portugal, será atingir 60% do PIB em exportações até 2030, com significativo aumento do valor acrescentado nacional, o qual dá o contributo das exportações para o PIB. Todos os sectores da economia podem e devem concorrer para esse objetivo, com relevo para a indústria, a agroindústria, a agricultura, as pescas e os serviços, nomeadamente tecnológicos, mas também  as industrias culturais e criativas e o turismo baseado na qualidade e na beleza do País e articulado com as industrias culturais e criativas e não um turismo com base em baixos salários que não contribui para o aumento da produtividade nacional.

Neste contexto importa também estimular a integração das nossas PMEs nas cadeias de valor globais e o investimento direto das empresas portuguesas nos mercados para os quais exportavam.

O tão desejado aumento das exportações e do seu valor acrescentado e o redimensionamento das empresas na sustentabilidade dos negócios pela internacionalização, investimento físico produtivo ou comercial no exterior, é fundamental.

III. A ATRAÇÃO DO IDE

A localização geográfica de Portugal nas rotas do Atlântico e no centro dos dois maiores mercados mundiais, a Europa e os Estados Unidos, permite apostar na atração do investimento direto estrangeiro (IDE) com confiança. O objetivo principal é atrair empresas industriais, que exportem produtos globais e com mercados assegurados.  Trata-se, principalmente, de empresas integradoras, as quais importam um número elevado de componentes e de sistemas e exportam os seus produtos finais, razão por que a qualidade e a competitividade da logística é essencial.

Também a qualidade das infraestruturas digitais nos permite a atração de IDE para a criação de Centros de Serviços Digitais para a economia global. Neste contexto, devíamos nomear um embaixador para os contactos com as empresas digitais globais, seguindo o exemplo da Dinamarca

O IDE deve ser levado a cabo na prática, por duas vias distintas, mas complementares:  forma ativa sobre o potencial da oferta aos investidores identificados nos fluxos dos interesses estratégicos dos grupos empresariais ou por setores em mobilidade geográfica; forma passiva no acolhimento dos investidores que nos procuram em que a nossa posição terá de ser baseada num conhecimento da nossa concorrência do que ela oferece a fim de sermos competitivos com o interesse nacional bem identificado nas suas várias vertentes.

IV. LOGíSTICA

A localização de Portugal no centro das rotas do Atlântico oferece uma logística marítima de excecional qualidade e competitividade. Infelizmente, o mesmo não acontece com as importações e exportações para os outros países europeus. Somos fisicamente periféricos em relação ao centro europeu, importando desenvolver uma logística que minimize essa desvantagem. Esta é uma razão para a urgência da construção de uma linha férrea nova e interoperável com o resto da Europa em bitola UIC (bitola europeia). Trata-se de um recurso central na estratégia de atração do investimento estrangeiro e de incremento das exportações para o centro da Europa. A incompreensão da importância deste fator é trágica e inaceitável.

V. PROPOSTAS

Propõe-se um Programa de Incentivos, Focado e Robusto, que contemple os seguintes programas essenciais:

  • Reforço dos capitais próprios das empresas, nomeadamente as industriais. E a forma mais simples e saudável de reforçar a capitalização das empresas é a redução da taxa de IRC, em simultâneo com a eliminação do IRC para os lucros reinvestidos na própria empresa. Trata-se dum incentivo duplamente virtuoso, pois não só incentiva os acionistas a “deixarem “ o dinheiro na empresa, como “ premeia quem já demonstrou na arena dos mercados competitivos que consegue ganhar dinheiro “ . E além disso reduz ao mínimo a intervenção do Estado, que no caso português tem sido infelizmente e por vezes motivo para “uma excessiva e pesada carga burocrática e/ou para promiscuidades indesejáveis “ .
  • Incentivos financeiros e fiscais ao Crescimento das Empresas Nacionais, por fusões e aquisições, de modo a atingirem massa crítica que lhes permita adotar processos de inovação radical.
  • Reforço do Balanço das empresas resultantes destes processos de fusão e aquisição, através da injeção de quasi-capital (uma espécie de contingent-convertibles-COCOs para a economia real) pelo Banco de Fomento. O Banco de Fomento deve concentrar-se nas falhas de mercado e de sistema do setor financeiro privado, designadamente o bancário.
  • Apoio á criação duma Empresa Líder e duma Empresa Challenger, em cada sector industrial, que imprimam o ritmo de desenvolvimento do sector.
  • Incremento da capacidade de engenharia e de gestão das empresas industriais, com a reposição do programa JTI — Jovens Técnicos para a Indústria e criação dum novo programa equivalente, JDI — Jovens Doutorados para a Indústria, aumentando, deste modo a capacidade para a inovação radical, promovendo ao mesmo tempo a obtenção de doutoramentos para a indústria em ambiente empresarial através de programas desenhados com as empresas.
  • Desenvolver e multiplicar programas de colaboração entre instituições do Sistema Científico e Tecnológico nacionais e estrangeiras com a participação das nossas empresas.
  • Criação dum programa de robustecimento dos Centros Tecnológicos Sectoriais, que estabeleçam contratos com objetivos a atingir, com as respetivas Associações Empresariais Sectoriais.
  • Desenvolvimento das Indústrias Culturais e Criativas (ICC). Trata-se de um setor fortemente exportador e em rápido crescimento, que pode e deve ser articulado com um setor turístico de qualidade e com as plataformas digitais e o cluster das Tecnologias de Informação e Comunicação

Luís Mira Amaral, Engenheiro (IST) e economista (MSc Nova SBE)