Miguel Beleza dizia que na economia há a micro e a má economia. Exemplo de má economia é o projeto do hidrogénio, ao deixar sem resposta muitas interrogações.

Com muita graça, Miguel Beleza dizia que na economia há a micro e a má economia. Significava ele que tal qualificação da macroeconomia se devia à perturbação na atividade económica por opções não racionais dos governos, políticas de incentivos sem criação de valor e alheias à escassez de recursos, motivadas por interesses políticos e eleitorais.

Exemplo de má economia é o projeto do hidrogénio, ao deixar sem resposta muitas interrogações.

– Qual a justificação económica para um projeto cuja viabilidade exige incentivos em todas as suas fases, produção, transporte, armazenamento e utilização, tal o diz a Consulta Pública? – Qual o sentido de assim obrigar os portugueses a suportar os riscos e sobrecustos de uma tecnologia imatura que mais que duplica o preço de mercado da eletricidade, massacrando famílias, empresas e competitividade e subsidiando os países concorrentes?

– Qual a razão de argumentar que o projeto visa cumprir as orientações de descarbonização da EU para 2030, quando o Governo pretende chegar a 80% de renováveis e o objetivo europeu é de 50%, e sabendo-se que Portugal nada polui à escala mundial?

– Qual o custo de oportunidade de um projeto gigantesco, que começa em 7 mil milhões de euros e consome grande parte dos fundos europeus, face a outros que promovam a modernização da estrutura produtiva do país, repartindo simultaneamente os riscos envolvidos?

– Se a Alemanha, com uma economia 16 vezes superior à nossa, irá investir o equivalente a 560 milhões à escala portuguesa, como explicar o vanguardismo português?

– Não é absurdo lançar concurso para mais potência solar, preço indiretamente garantido, que amplia a capacidade já excedentária de renováveis para a ponta de consumo ao fim de semana, para gastar na produção de hidrogénio para armazenar e voltar a produzir eletricidade mais cara?

– Qual a valia do argumento do interesse do capital privado no projeto, se há uma garantia de preço ou subsídios em todas as suas fases e segmentos?

Respostas, vi uma, a do Ministro do Ambiente quando, em entrevista, aludiu ao “compromisso que os portugueses têm com os seus impostos para potenciar este tipo de projetos”. Certo é que os portugueses não subscreveram tal compromisso de tão má e cara economia, como esta de ter hidrogénio movido a impostos.

Artigo de opinião do economista António Pinho Cardão publicado no Dinheiro Vivo, a 29/08/2020.